As técnicas teatrais estão longe de ser sagradas.
Os estilos em teatro mudam radicalmente com o passar dos anos, pois as técnicas
do teatro são técnicas de comunicação. A existência da comunicação é muito mais
importante do que o método usado. Os métodos se alteram para entender as
necessidades de tempo e espaço.
Quando uma técnica teatral ou convenção de palco é vista como um ritual e a razão para sua inclusão na lista das habilidades do ator é perdida, então ela se torna inútil. Uma barreira artificial é estabelecida quando as técnicas estão separadas da experiência direta. Ninguém separa o arremesso de uma bola de jogo em si.
Quando a forma de uma arte se torna estática, essas “técnicas” isoladas, que se presume constituam a forma, estão sendo ensinadas e incorporadas rigidamente. O crescimento tanto do indivíduo como da forma sofre, consequentemente, pois a menos que o aluno seja extraordinariamente intuitivo, tal rigidez no ensino, pelo fato de negligenciar o desenvolvimento interior, é invariavelmente refletida em seu desempenho.
Pois através da consciência direta e dinâmica de uma experiência de atuação que experimentação e as técnicas são espontaneamente unidas, libertando o aluno para o padrão de comportamento fluente no palco. Os jogos teatrais fazem isso.
O ator tem obrigação de viver interiormente o papel e depois dar à sua experiência uma encarnação exterior. Peço-lhes sobretudo, que reparem que a dependência do corpo em relação à alma é de particular importância em nossa escola de arte. A fim de exprimir uma vida delicadíssima e em grande parte subconsciente, é preciso ter controle sobre uma aparelhagem física e vocal extraordinariamente sensível, otimamente preparada.
Esse equipamento deve estar pronto para reproduzir, instantânea e exatamente, sentimentos delicadíssimos e quase intangíveis, com grande sensibilidade e o mais diretamente possível. É por isso que o ator do nosso tipo precisa trabalhar tão mais que os outros, tanto no seu equipamento interior, que cria a vida do papel, como, também, na sua aparelhagem exterior, física, que deve reproduzir com precisão os resultados do trabalho criador das suas emoções. Até mesmo a externalização de um papel é muito influenciada pelo subconsciente. Com efeito, nenhuma técnica artificial, teatral, pode sequer comparar-se às maravilhas que a natureza produz.
(Constantin Stanislavski “A prearação do ator Pág 52/53) "Não pode haver arte verdadeira sem vida. Ela começa onde o sentimento assume os seus direitos. E a atuação mecânica Começa onde a arte criadora acaba. Na atuação mecânica não há lugar para um processo vivo, e quando este ocorre, é só por acaso.
"Com o auxílio do rosto, da mímica, da voz e dos gestos, o ator mecânico apenas oferece ao público a máscara morta do sentimento inexistente. Para tanto, foi elaborado um grande sortimento de efeitos pitorescos que pretendem representar toda espécie de sentimentos por meio de recursos exteriores. "Alguns desses clichés estabelecidos se tornaram tradicionais e são transmitidos de geração a geração, como, por exemplo, espalmar a mão no peito para exprimir amor, ou escancarar a boca para dar a ideia de morte. Outros são tomados, já prontos, de atores contemporâneos de talento (como esfregar a testa com as costas da mão, tal qual fazia Vera Komissarjevskaia nos momentos trágicos). Outros, ainda, são inventados pêlos atores para seu próprio uso.
"Há modos especiais de recitar um papel, métodos de dicção e de fala. Por exemplo: usar tons exageradamente agudos ou graves nos momentos críticos do papel, executando-os com um tremolo especificamente teatral ou com especiais adornos declamatórios.
Há, também, processos de movimentação física (o ator mecânico não anda; desfila pelo palco), de gestos e ação, de movimentação plástica.
Há métodos de exprimir todos os sentimentos e paixões humanas (mostrar os dentes e revirar o branco dos olhos quando se tem "ciúmes ou esconder os olhos e o rosto entre as mãos em vez de chorar; quando desesperado, arrancar os cabelos). Há modos de imitar toda espécie de tipos e pessoas de diferentes classes sociais (os camponeses cospem no chão, assoam o nariz na aba do paletó; os militares fazem tinir as esporas; os aristocratas ficam brincando com as luas lorgnettes). Alguns outros caracterizam épocas (gestos operisticos para a Idade Média, passinhos miúdos para o século XVIII). Esses métodos mecânicos já prontinhos podem ser facilmente adquiridos por meio de exercícios constantes, de modo a se tornarem uma segunda natureza.
Não é de nossa tradição de preparo e de formação do ator, um aprimoramento da dança, do canto, da voz e dos malabarismos corporais. Os nossos atores, salvo abençoadas exceções, se dançam, não cantam, se são bons intérpretes são péssimos cantores ou, se dançam bem, são verdadeiras catástrofes na interpretação de um texto. Dentro deste quadro, o ator, solicitado aos mais variados espetáculos, usarecursos próprios de desenvolvimento pessoal, quase intuitivos e de pouca fundamentação científica, o que acarreta, na maioria das vezes, problemas de saúde,
Por outro lado, o ator é um verdadeiro mestre em descobrir e mostrar as emoções do espírito humano e, às vezes com perfeição, passa das emoções sutis e delicadas aos sentimentos grosseiros e violentos.
Mas, quase sempre, encontra-se o ator bastante alienado dos processos psíquicos
que desencadeia durante a busca e a vivência cênica das emoções que as suas
personagens exigem.
Em muitas circunstâncias, atira-se a laboratórios, em busca de uma verdade emocional cênica, ou participa de experiências as mais disparatadas, na ânsia de encontrar a emoção adequada e ideal ao movimento-vida da personagem. Na maioria das vezes, no entanto, isso é feito leigamente, sem o controle de profissionais preparados e responsáveis que possam prever, preparar ou reajustar um proceder mais delicado, tornando o trabalho do ator mais seguro, mais humano, permitindo retomar o seu equilíbrio psico lógico após a jornada de trabalho.
Também não é de hábito monitorar o ator com esclarecimentos sobre anatomia humana, fisiologia básica, as leis que regem o movimento, o som, a acústica e demais elementos científicos com que — por força da lide profissional — ele é obrigado a conviver no dia-a-dia, mas sem grandes conhecimentos.
Nossa tradição de encenação prevê, apenas, a figura do encenador ou diretor que, via de regra, chega a essa função nem sempre pelas portas de uma escola preparatória e adequada, percorrendo, isto sim, caminhos os mais diversos e passando por formações muitas vezes desconcertantes. O fato é que o diretor ou encenador, salvo raras oportunidades, é o único responsável pelo elenco e só a ele cabe a orientação geral e particular de sua equipe cénica.
Nenhum comentário:
Postar um comentário