Teatro do oprimido
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Teatro do
Oprimido (TO) é um método teatral que reúne
exercícios, jogos e técnicas teatrais elaboradas pelo teatrólogo brasileiro Augusto Boal. Os seus
principais objetivos são a democratização dos meios de produção teatral, o
acesso das camadas sociais menos favorecidas e a transformação da realidade
através do diálogo (tal como Paulo
Freire pensou a educação) e do teatro. Ao mesmo tempo,
traz toda uma nova técnica para a preparação do ator que tem grande repercussão mundial.
A sua origem
remete ao Brasil das décadas de 60 e 70, mas o termo é citado textualmente pela
primeira vez na obra Teatro do
oprimido e outras poéticas políticas. Este livro reúne uma série
de artigos publicados por Boal entre 1962 e 1973, e pela primeira vez
sistematiza o corpo de idéias desse teatrólogo.
Histórico
No começo
dos anos sessenta, Boal era diretor do Teatro
de Arena de São Paulo. Um dia, durante uma viagem
pelo nordeste, estavam apresentando para uma liga camponesa um musical
sobre a questão agrária que terminava exortando os sem terras a lutarem e darem
o sangue pela terra. Ao final do espetáculo um sem terra convidou o grupo para
ir enfrentar os jagunços que tinham desalojado um companheiro deles. O grupo
recusou e, neste momento, Boal percebeu que o teatro que realizava dava
conselhos que o teatro deveria ser um diálogo e não um monólogo.
Até este
momento tudo não passava de uma idéia a ser desenvolvida. Somente em 1971 no
Brasil, nasceu a primeira técnica do Teatro do
Oprimido: o Teatro
Jornal. Continuando a crescer, o TO desenvolveu o Teatro Invisível na Argentina, como atividade política, e o Teatro Imagem, para estabelecer um diálogo
entre as Nações Indígenas e os descendentes de espanhóis na Colômbia, na Venezuela, no México... Hoje, essas formas são
usadas em todos os tipos de diálogos.
Na Europa, o
TO se expandiu e veio à luz o Arco-Íris do
Desejo —
inicialmente para entender problemas psicológicos, mais tarde para criar
personagens em quaisquer peças. De volta ao Brasil, nasceu o Teatro Legislativo, para ajudar a transformar o
Desejo da população em Lei — o que chegou a acontecer 13 vezes. Agora, o Teatro Subjuntivo está, pouco
a pouco, vindo à luz.
O
TO era usado por camponeses e operários; depois, por professores e estudantes;
agora, também por artistas, trabalhadores sociais, psicoterapeutas, ONGs.
Primeiro, em lugares pequenos e quase clandestinos. Agora, nas ruas, escolas,
igrejas, sindicatos, teatros regulares, prisões...
Além da arte
cênica propriamente, também existe a finalidade política da conscientização,
onde o teatro torna-se o veículo para a organização, debate dos problemas, além
de possibilitar, com suas técnicas, a formação de sujeitos sociais que possam
fazer-se veículo multiplicador da defesa por direitos e cidadania para a
comunidade onde o Teatro do Oprimido está a ser aplicado.
Aplicado no
Brasil, em parceria com diversas ONGs, como as católicas Pastoral Carcerária[1] e CEBs
(Comunidades Eclesiais de Base), ou movimentos sociais, como o MST, as
técnicas de Boal ganharam mundo, sendo suas obras traduzidas em mais de 20
idiomas, e ganhando aplicação por parte de populações oprimidas nas mais
diversas comunidades, como recentemente entre os palestinos[2]
Metodologia
O Teatro do Oprimido é um
método estético que sistematiza Exercícios, Jogos e Técnicas Teatrais que
objetivam a desmecanização física e intelectual de seus praticantes, e a
democratização do teatro.
O TO parte
do princípio de que a linguagem teatral é a linguagem humana que é usada por todas as pessoas no
cotidiano. Sendo assim, todos podem desenvolvê-la e fazer teatro. Desta forma,
o TO cria condições práticas para que o oprimido se aproprie dos meios de
produzir teatro e assim amplie suas possibilidades de expressão. Além de
estabelecer uma comunicação direta, ativa e propositiva entre espectadores e
atores.
Dentro do
sistema proposto por Boal, o treinamento do ator segue uma série de proposições
que podem ser aplicadas em conjunto ou mesmo separadamente.
Cumpre
ressaltar que todas as técnicas pressupõem a criação de grupos, onde o Teatro
do Oprimido terá sua aplicação.
Teatro-Jornal
O
Teatro-Jornal foi uma resposta estética à censura imposta, no Brasil, no início
dos anos 70, pelos militares, para escamotearem conteúdos, inventarem verdades
e iludirem. Nesta técnica, encena-se o que se perdeu nas entrelinhas das
notícias censuradas, criando imagens que revelam silêncios. Criada em 1971, no
Teatro de Arena de São Paulo, esta técnica foi muito utilizada na época da
ditadura militar brasileira, para revelar informações distorcidas pelos jornais
da época, todos sob censura oficial. Ainda hoje é usada para explicitar as
manipulações utilizadas pelos meios de comunicação.[3]
Teatro Imagem
No
Teatro-Imagem, a encenação baseia-se nas linguagens não-verbais. Essa foi uma
saída encontrada por Boal para trabalhar com indígenas, no Chile, de etnias
distintas com línguas maternas diversas, que participavam de um programa de
alfabetização e precisavam se comunicar entre si. Esta técnica teatral
transforma questões, problemas e sentimentos em imagens concretas. A partir da
leitura da linguagem corporal, busca-se a compreensão dos fatos representados
na imagem, que é real enquanto imagem. A imagem é uma realidade existente
sendo, ao mesmo tempo, a representação de uma realidade vivenciada.[4]
Teatro Invisível
O
Teatro-Invisível que, sendo vida, não é revelado como teatro e é realizado no
local onde a situação encenada deveria acontecer, surgiu como resposta à
impossibilidade, ditada pelo autoritarismo, de fazer teatro dentro do teatro,
na Argentina. Uma cena do cotidiano é encenada e apresentada no local onde
poderia ter acontecido, sem que se identifique como evento teatral. Desta
forma, os espectadores são reais participantes, reagindo e opinando
espontaneamente à discussão provocada pela encenação.[5]
A preparação
do Teatro Invisível deve ser como a de uma cena normal, reunindo os principais
elementos: atores interpretando personagens com caracterizações, idéia central;
deve haver um roteiro pré-estabelecido, apresentando princípio, meio e fim e
que deve ser ensaiado. A diferença consiste em ser uma modalidade que não
revela ao público tratar-se de uma representação.
Pode ou não
ser uma representação pessoal, variando em vários aspectos como econômico e
social.
Teatro-Fórum
A
dramaturgia simultânea era uma espécie de tradução feita por artistas sobre os
problemas vividos pelo povo. Aí nasceu o Teatro-Fórum, onde a barreira entre
palco e platéia é destruída e o Diálogo implementado. Produz-se uma encenação
baseada em fatos reais, na qual personagens oprimidos e opressores entram em
conflito, de forma clara e objetiva, na defesa de seus desejos e interesses. No
confronto, o oprimido fracassa e o público é estimulado, pelo Curinga (o facilitador
do Teatro do Oprimido), a entrar em cena, substituir o protagonista (o
oprimido) e buscar alternativas para o problema encenado.[6]
Arco-Íris do Desejo
Nos
anos de 1980, na França, Augusto Boal e Cecília Boal se deparam com opressões
ligadas à subjetividade, sem relação com uma agressão física ou um impedimento
concreto na vida cotidiana. Um arsenal de técnicas que analisam os opressores
internalizados, o Arco-Íris do Desejo, foi a resposta a esta demanda. Conhecido
como Método Boal de Teatro e Terapia, é um conjunto de técnicas terapêuticas e
teatrais utilizadas no estudo de casos onde os opressores foram internalizados,
habitando a cabeça de quem vive oprimido pela repercussão dessas idéias e
atitudes.[7]
Teatro Legislativo[
Início
– 1993
Hoje,
aos dezesseis anos de idade, se pode exercer um dos principais direitos da
cidadania: VOTAR. Mas em 1973 um jovem que completasse dezoito anos só poderia
tirar o Título de Eleitor (idade mínima na época), mas não poderia votar . Foi
o que aconteceu comigo! Porque no Brasil desse período, esse e tantos outros
direitos estavam impedidos por uma ferrenha e cruel ditadura militar. Não havia
espaço para discutir a política em geral, nem a partidária. De fato não havia
partidos políticos. Em 1981 foi iniciada a chamada “abertura lenta e gradual”.
Debater e votar mesmo com toda liberdade só a partir de 1989, com a eleição
para presidente da República.
O
resultado de 25 anos sem exercitar plenamente esse direito criou um vácuo que
ainda hoje tem reflexos na falta de politização da grande maioria da população.
Consequência de 25 anos amordaçada, engessada de um direito fundamental,
estabelecido e reconhecido desde a Grécia de Platão. Que levou à cassação do
primeiro presidente eleito após o período de ditadura. Mas durante a
movimentação popular, e por causa dela, no período da campanha de cassação
desse presidente, surgiu algo novo na política brasileira e, podemos até dizer,
mundial: O TEATRO LEGISLATIVO. Que sabemos, até agora a única experiência de um
grupo teatral tomar assento no Legislativo.
“O
Teatro Legislativo é um novo sistema, uma forma mais complexa, pois inclui
todas as formas anteriores do Teatro do Oprimido e mais algumas, especificamente
parlamentares. Espero que esta experiência sirva, além do nosso mandato, além
do nosso partido, além da nossa cidade, muito além. Espero que seja útil”
Augusto Boal – Livro Teatro Legislativo
E
tudo começou em 1992 quando Augusto Boal, teatrólogo, diretor de teatro e
escritor – criador da Metodologia do Teatro do Oprimido – convencido por cinco
tenazes Curingas (versão tupiniquim dos Três Mosqueteiros) do Centro de Teatro
do Oprimido – CTO, e mais alguns grupos de alucinados praticantes de Teatro-Fórum
(inclusive eu e Helen Sarapeck, que também é da equipe do CTO até hoje, que na
época integravamos o grupo Ararajuba na Moita, formado por ativistas do
Movimento ambientalistas do Rio de Janeiro) o convenceram a candidatar-se a
Vereador nas eleições municipais daquele ano.
Boal
disse que aceitaria ser candidato se esses grupos e pessoas praticantes do
Teatro do Oprimido aceitassem participar da campanha eleitoral para fazermos
como ainda não houvera: uma campanha teatral.
“E também porque
eu não corro o menor risco de ser eleito, mas se fosse levaríamos o Teatro do
Oprimido para o Legislativo”.
A Campanha
Político Teatral Augusto Boal foi às ruas do Rio e… Augusto Boal foi eleito! E
a citação inspirou o nome de mais uma técnica do Teatro do Oprimido: TEATRO
LEGISLATIVO.
Então,
em 1 de janeiro de 1993, teve início essa inusitada e ousada experiência que se
concretizou através de um trabalho integrado entre um grupo teatral formado por
biólogos, químicos, sociólogos, universitários, bancários, artistas plásticos,
donas de casa, estudantes secundaristas e assessores legislativos. Com direção
artística de um ex-químico industrial já reconhecido mundialmente como
teatrólogo e criador da Metodologia do Teatro do Oprimido. E, a partir desse
mandato de vereador, também mentor do Teatro Legislativo. Que em sua essência
procura devolver o teatro ao centro da ação política – centro de decisões.
Fazer teatro
como política e não apenas teatro político já realizado intensamente ao longo
dos séculos 19 e 20, inclusive no Teatro de Arena de São Paulo, onde Boal foi
diretor.
No
Teatro Legislativo (TL) a atividade política é exercida para transformar em lei
a necessidade expressa e debatida de forma lúdica através da cena de
Teatro-Fórum. Ou seja, é fazer política mesmo por pessoas que declaram que “não
querem saber de política”. Frase que expressa o descontentamento com a atuação
de representantes eleitos. Com o TL as pessoas percebem que fazer política é da
própria natureza humana. Que tudo é uma ação política, inclusive dizer que não
quer saber de política. Porque quem diz isso faz a ação política de recusar-se
a fazer algo para mudar alguma situação que a oprime.
Assim,
para mudar esse formato, no início do Mandato Político Teatral Augusto Boal,
com o lema “Coragem de Ser Feliz”, a equipe de Curingas (especialistas no
Teatro do Oprimido) do Centro de Teatro do Oprimido partiu para a prática
através da formação de grupos de Teatro-Fórum em comunidades, escolas,
associações de moradores, igrejas, estudantes negros universitários,
trabalhadoras domésticas, trabalhadores rurais sem terra, pessoas portadoras de
deficiência física, jovens que viviam nas ruas, etc. Uma lista completa pode
ser consultada no livro Teatro Legislativo.
A
Prática
Chegamos
a formar 60 Núcleos de Teatro do Oprimido dos quais 33 permaneceram estáveis.
Para se ter uma idéia mais precisa da forma como trabalhávamos, reproduzo a
descrição da página 66 do livro Teatro Legislativo sobre como o Mandato
Político Teatral Augusto Boal trabalha em conjunto com a população:
“O Rio é uma
cidade de contrastes: extrema riqueza à beira da praia, pobreza extremada no
alto dos morros – cidade espremida entre a montanha e o mar.
Nessa cidade
organizamos uma rede de parceiros, “Núcleos” e “Elos”, tendo cada qual a sua
importância e especificidade.
Um
Elo é um conjunto de pessoas da mesma comunidade e que se comunica
periodicamente com o Mandato, expondo suas opiniões, desejos e necessidades.
Essa relação pode-se dar através da presença na Câmara Municipal, na comunidade
ou em outros locais onde se realizem atividades do Mandato. Pode-se dar
pessoalmente, através da Câmara na Praça ou da Mala Direta Interativa.
Um
Núcleo é um elo que se constitui em grupo de Teatro do Oprimido e, ativamente,
colabora com o Mandato de forma mais freqüente e sistemática.”
Como
essa experiência era única, as dificuldades também. Porque era o
desenvolvimento de uma ideia cuja pesquisa e a prática aconteciam ao mesmo
tempo e com prazo de validade para apresentar resultados concretos. E muitas
descobertas reveladoras de como a cidadania pode ser praticada com intensidade
por toda a população. É só ter oportunidade. Por exemplo:
Durante
o Mandato realizávamos diversas atividades para incentivar esse protagonismo:
através das cenas de Teatro-Fórum (TF) dos grupos populares às Sessões de
Teatro Legislativo. Até a Câmara na Praça, quando um dos grupos apresentava sua
cena de TF na calçada em frente ao prédio da Câmara dos Vereadores, na
Cinelândia. As escadarias serviam de arquibancada e uma lona para o chão e uma
estrutura de fundo (que chamávamos de “palquinho”) delimitavam o Espaço Cênico.
A(o)s
vereadora(e)s eram convidada(o)s a participarem porque a ideia era reproduzir
na rua o que acontecia (ou deveria) no plenário. No máximo contávamos com a
presença de 4 ou 5 (cerca de 10%), porque não era fácil para a grande maioria
ficar frente a frente a eleitora(e)s em geral, para debaterem problemas e
votações muitas vezes polêmicas.
E
se era dia de votação no Plenário, as pessoas eram convidadas a entrar. Quase a
totalidade jamais havia entrado sequer no prédio, muito menos para acompanhar
uma votação. E ficavam surpresas ao convidarmos. Muitas entravam e depois
diziam que gostariam de retornar. Faziam questão de pegar os contatos do
Mandato e algumas vezes perguntavam o que era necessário para terem uma oficina
de TF em sua comunidade ou bairro.
Essa era uma das
formas do Teatro Legislativo ativar o EXERCÍCIO PLENO DA CIDADANIA.
Através
dessa verdadeiramente Revolucionária iniciativa foram aprovadas 13 Leis Municipais,
e vários outros Projetos de Lei que não foram aprovados porque a maioria da(o)s
vereadora(e)s não comungavam da mesma prática do Mandato Boal de incentivar a
CIDADANIA PLENA.
Também foi
originada a proposta que resultou em 1997, após o final do Mandato, na Primeira
Lei brasileira de Proteção às Testemunhas de Crimes, que veio a inspirar a Lei
Federal de Proteção às Testemunhas.
O
Desafio – 1997
Em
dezembro de 1996 terminou o Mandato Político Teatral Augusto Boal, que devido a
riqueza da experiência motivou novamente outros quatro novos Curingas, mais
Claudete Felix oriunda do primeiro grupo de multiplicadora(o)s formada(o)s por
Boal em 1986, a continuarem a trabalhar com essa ideia de Exercício Pleno da
Cidadania agora com o desafio de fazer o Teatro Legislativo sem a ligação
orgânica com um vereador, que existia até então.
Assim,
o CTO foi registrado como Pessoa Jurídica na forma de Associação Sem fins
Lucrativos, para criar as condições jurídicas necessárias na busca de apoio a
projetos que possibilitassem a equipe do CTO, com Augusto Boal como Diretor
Artístico mais a(o)s Curingas Bárbara Santos, Claudete Felix, Geo Britto, Helen
Sarapeck e Olivar Bendelak, vencer esse Desafio. Exceto Claudete, éramos
oriundos de Grupos de Teatro-Fórum.
Em
1998 conseguimos apoio da Fundação Ford que possibilitou a criação de sete
novos grupos populares de Teatro-Fórum, com temáticas sobre gravidez precoce;
prevenção às DST/AIDS; homossexualidade; direitos da(o)s trabalhadora(e)s
doméstica(o)s; preconceito com moradora(e)s de comunidades e problemas para
manter um pré-vestibular comunitário. Com esses grupos continuamos a fazer
apresentações das cenas e a recolher Propostas de Lei das platéias.
Agora que não
tínhamos mais os Assessores Legislativos do Mandato de vereador, começamos a
fazer contato com os gabinetes de vereadora(e)s e deputada(o)s estaduais em
busca de parlamentares interessada(o)s em fazer parceria para continuarmos com
o TL.
Poucos
tinham interesse em apoiar essa iniciativa que de fato incentiva o EXERCÍCIO
PLENO DA CIDADANIA, já que marcávamos reuniões nos gabinetes e no CTO, entre
a(o)s parlamentares e sua(e)s assessora(e)s com a(o)s integrantes dos grupos
populares. Além de solicitarmos suas presenças nas apresentações para
presenciarem como apareciam as Propostas de Lei da platéia.
Após
uma das reuniões no gabinete de um deputado estadual, uma jovem integrante de
um grupo popular de TF de uma comunidade da Zona Norte da cidade expressou sua
alegria e admiração:
“Eu achava que
nem passaríamos da sala de espera do gabinete e fomos recebida(o)s pelo próprio
deputado, dentro da sala dele para debatermos as Propostas de Lei que
recolhemos.”
Essa jovem
começava a perceber que Exercia Plenamente sua Cidadania.
Quanta(o)s
eleitora(o)s no Brasil já entraram em um gabinete parlamentar para debater
Propostas de Lei, que ela(e)s própria(o)s recolheram, de alternativas aos seus
problemas?
Posso dizer que,
desde 1997, centenas de pessoas que integram os grupos populares de TF, se
ainda não fizeram isso, sabem que podem fazê-lo.
Desafio vencido – 2001
E
de uma alternativa do grupo popular de TF Corpo EnCena, de uma comunidade do
Rio, que ainda não havia encontrado alternativas para ter professora(e)s
voluntária(o)s em seu Pré-Vestibular Comunitário surgiu A PRIMEIRA LEI ESTADUAL
DO TEATRO LEGISLATIVO.
O
que comprovava que era possível continuar a fazer TL mesmo sem ter mais um
parlamentar ligado diretamente, como era Boal quando vereador.
E
como que para reafirmar essa possibilidade, em 2004 tivemos uma segunda Lei
Estadual aprovada, originada das apresentações do grupo Panela de Opressão, de
comunidade da Zona Oeste do Rio, sobre obrigatoriedade de camisinhas femininas
em motéis, hotéis e similares. Essa cena também deu origem a um Projeto de Lei
Municipal que não teve maioria em votação no Plenário da Câmara Municipal.
Para
levar essa riquíssima experiência de uma Sessão Solene Simbólica de Teatro
Legislativo ao público em geral o CTO realizou no Rio cinco edições do FESTEL –
Festival de Teatro Legislativo, com apresentações de grupos do Rio, São Paulo e
Recife. Onde todas as quatro noites aconteceram apresentações de cenas de
Teatro-Fórum com as Sessões de TL. Com a presença de Assessores Legislativos e
pessoas conhecedoras da temática da cena, para que se possa debater e
esclarecer sobre as Propostas escritas pela platéia (em uma Sessão solene
escolhemos duas propostas que sejam as mais objetivas e representativas) para
que se faça a votação. Para isso são distribuídos a cada pessoa da platéia um
cartão Verde (Aprova), um Vermelho (Rejeita) e um Amarelo (abstenção).
As
propostas aprovadas é que são encaminhadas ao Legislativo ou a para uma Ação
Social Concreta Continuada, caso o problema não requeira uma lei e sim uma
mobilização – indicação que pode aparecer na intervenção da platéia (Fórum) e
por escrito.
Por
exemplo: caso o problema seja dotar o Posto de Saúde da Comunidade de
equipamentos novos. Para isso não é necessária uma lei, mas a mobilização da
Comunidade para pressionar a Secretaria Municipal de Saúde. E para isso a cena
de TF pode ser apresentada em frente a essa Secretaria para pressionar que o
Secretário de Saúde receba o grupo e representantes da Comunidade e se
comprometa, com prazo determinado, a resolver a situação.
Um
novo marco – CLP
Até
2005 tínhamos mais de cem (100) Propostas de Lei e algumas eram, de acordo com
as assessorias de veradora(e)s e deputada(o)s então parceira(o)s, de cunho
Federal. Já havíamos encaminhado a um deputado federal, mas sem conseguir ter
retorno efetivo.
Essa
necessidade nos levou a começar a visitar a página da Câmara dos Deputados
Federais. Foi assim que descobrimos que existia a Comissão de Legislação
Participativa – CLP, canal efetivamente democrático para a população brasileira
propor leis sem depender da intermediação de um(a) deputado(a) específico(a).
As Sugestões Legislativas (denominação utilizada pela CLP) podem ser
apresentadas por qualquer instituição brasileira que seja registrada
juridicamente, como o Centro de Teatro do Oprimido, por exemplo. Assim, enviamos
as Propostas de Lei e atualmente temos três Projetos de Lei federais em
tramitação na câmara dos Deputados e uma transformada em indicação ao
Executivo.
Em
duas oportunidades foi agendada uma Audiência Pública na Câmara dos Deputados,
através da CLP, sobre o Teatro Legislativo com foco no Teatro do Oprimido nas
Prisões. As duas tiveram que ser canceladas, por problemas de greve na aviação
e convocação para votação urgente na Câmara.
Pretendemos
fazer essa audiência em nova oportunidade para que o Teatro Legislativo seja
debatido e mais conhecido no Congresso Nacional.
O
Teatro Legislativo difundido no Brasil
A
partir do projeto Teatro do Oprimido nas Prisões, desde sua primeira etapa
iniciada em 2003 em cinco Estados do Brasil, o Teatro Legislativo começou a ser
difundido para além do Rio de Janeiro. Nas Mostras Estaduais e Regionais desse
projeto a equipe do CTO começou a realizar Sessões Solenes Simbólicas de Teatro
Legislativo, que originaram Propostas de Lei, algumas de âmbito federal. O que
originou dois Projetos de Lei Federais e a indicação ao Executivo.
Atualmente,
com os projetos Fábrica de Teatro Popular Nordeste (em três Estados) e Teatro
do Oprimido de Ponto a Ponto (em 18 Estados) o TL se expande ainda mais através
das Sessões Simbólicas realizadas nas Mostras desses projetos.
Desafio
maior
Comprovamos
que é possível a aprovação de leis mesmo sem um parlamentar ligado diretamente
ao TL, mas também essa experiência nos mostra que a MOBILIZAÇÃO é essencial
para que o acompanhamento de todas as etapas SEJA EFETIVO, desde o acolhimento
de uma proposta por um(a) parlamentar ou pela CLP – Comissão de Legislação
Participativa (no caso da Proposta ser de âmbito federal) até se tornar um
projeto de Lei e daí para a aprovação como Lei.
Quando
o grupo popular já participa e/ou realiza mobilizações para lutar por seus
direitos a motivação para acompanhar e pressionar até o final, que pode ser a
aprovação de uma lei, é mais natural.
Quando
ainda não existe essa ativação política é que se apresenta o desafio para que o
grupo perceba que só haverá o avanço se houver a mobilização. Como escreveu o
poeta: “Caminhante, não há caminho, ele se faz ao caminhar.”
Também
é importante que a(o)s praticantes de Teatro-Fórum percebam que para se fazer o
Teatro Legislativo não é necessário fazer uma Sessão Simbólica de Teatro
Legislativo. O principal é recolher Propostas de Lei por escrito em cada
apresentação, debatê-las com o grupo popular, fazer contato com especialistas
no tema e assessores legislativos para ver quais podem originar Projetos de
Lei. Foi assim com as duas leis estaduais do Teatro Legislativo no Rio de
Janeiro: do Corpo EnCena e do Panela de Opressão.
Conclusão
É
fato comprovado que o TEATRO LEGISLATIVO promove de fato o Exercício pleno da
Cidadania, que em si é um exercício que deve ser permanente. Ou seja, o
exercício do Teatro-Fórum nos leva ao Teatro Legislativo, que leva às Leis, que
nos garantem o exercício da Cidadania. Mas esta só é alcançada se exercitarmos
cotidianamente esse possibilidade de ser cidadã(o), através da busca por
alternativas para nossos problemas, que começa quando saímos da passividade.
Como
Augusto Boal escreveu, praticou e lutou incansavelmente, desde 1992 até maio de
2009, com a equipe do Centro de Teatro do Oprimido que o ajudou no nascimento e
desenvolvimento do Teatro Legislativo: “Cidadão não é aquele que vive em
sociedade - é aquele que a transforma!”[8]
Evolução: a
Estética do Oprimido]
As
iniciativas de Boal e do CTO-Rio, dentro dos propósitos do Teatro do Oprimido
vêm sendo ampliadas constantemente. Assim, integrando o Sistema, está sendo
desenvolvida a "Estética do Oprimido". Esta tem por fundamento a
certeza de que somos todos melhores do que pensamos ser, capazes de fazer mais
do que realizamos, porque todo ser humano é expansivo.
A
proposta é promover a expansão da vida intelectual e estética de participantes
de Grupos Populares de Teatro do Oprimido, evitando que exercitem apenas a
função de ator, que representa personagens no palco. Os integrantes desses
grupos são estimulados, através de meios estéticos, a expandirem a capacidade
de compreensão do mundo e as possibilidades de transmitirem aos demais membros
de suas comunidades - bem como aos de outras - os conhecimentos adquiridos,
descobertos, inventados ou re-inventados. (2007).
Notas]
·
BOAL, Augusto - Teatro do
oprimido e outras poéticas políticas. Rio de
Janeiro. Civilização Brasileira. 2005. Edição revista; (ISBN 85-200-0265-X)
·
BOAL, Augusto - "Técnicas
Latino-Americanas de teatro popular: uma revolução copernicana ao
contrário". São Paulo: Hucitec, 1975.
·
BOAL, Augusto - "Stop:
ces’t magique". Rio de Janeiro: Civilização
Brasileira, 1980.
·
BOAL, Augusto - "O
arco-íris do desejo: método Boal de teatro e terapia". Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 1990.
·
BOAL, Augusto - "Teatro
legislativo", Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1996.
·
BOAL, Augusto - "Jogos
para atores e não-atores". Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998.
·
BOAL, Augusto - "O teatro
como arte marcial". Rio de Janeiro: Garamond, 2003.
·
BOAL, Augusto - "A
Estética do Oprimido". Rio de Janeiro: Garamond, 2009.
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