COMO ESCREVER UMA
PEÇA DE TEATRO - III
Realismo. O estilo
realista no teatro é o que procura guardar fidelidade ao natural,
correspondência estreita entre a cena vivida no palco e a vida real quanto
aos costumes e situações da vida comum. Porém, se o dramaturgo escreve sua
peça com muita exatidão, o espectador não terá nenhuma vantagem em assisti-la
mais que observar a própria vida nela refletida. Se a peça mostra somente o
que vemos na vida mesma, não fará sentido alguém ir ao teatro. A questão
importante não é o quanto ela reflete exatamente da aparência da vida, mas o
quanto ajuda a audiência a entender o sentido da vida. O drama tornará a vida
mais compreensível se o autor descartar o irrelevante e atrair a atenção para
o essencial.
Ênfase. No drama, é
necessário aplicar o princípio positivo da ênfase de modo a forçar a platéia
a focar sua atenção naquele certo detalhe mais importante do enredo. Um dos
meios mais fáceis de ênfase é o uso da repetição. Ao escrever sua adaptação
da obra literária à dramaturgia, o dramaturgo tem presente uma importante diferença
entre o romance e a peça de teatro: esta última, sendo falada, não dá chance
ao espectador de voltar páginas para compreender algo que lhe tenha escapado
no início. Por esse motivo, os dramaturgos de um modo geral encontram meios
de dar ênfase repetindo uma ou duas vezes, ao longo da peça, o que houver de
importante no diálogo. A ênfase por repetição pertence ao diálogo e pode ser
habilmente introduzida no script.
Em geral, pode ser dito que
qualquer pausa na ação enfatiza "por posição" o discurso ou assunto
que imediatamente o precedeu. O emprego de uma pausa como uma ajuda para a
ênfase é de especial importância na leitura das falas, como um recurso a mais
para o dramaturgo.
Porém, há também momentos que
emprestam ênfase natural à representação, como os últimos momentos em
qualquer ato e, do mesmo modo, os primeiros momentos em um ato. Apenas os
primeiros momentos do primeiro ato perdem esse poder, devido à falta de
concentração dos espectadores que acabam de tomar seus lugares, ou são
perturbados por retardatários que passam pela frente das pessoas já sentadas.
Mas as ênfases nunca são colocadas na abertura de uma cena.
Para enfatizar o caráter de um
personagem, colocam-se no texto repetidas referências à sua pessoa, de modo
que na sua primeira aparição, o espectador já o conhece melhor que a qualquer
dos outros personagens. É claro, existem muitos meios menores de ênfase no
teatro, mas a maior parte destes são artificiais e mecânicos. A luz da
ribalta é uma das mais efetivas. A intensidade de uma cena também pode ser
criada, por exemplo, se a figura de um único personagem é projetada em
silhueta por um raio de luz contra um fundo mal definido. Mais tempo é
dado para cenas significativas que para diálogos de interesse subsidiário.
Antítese. Uma cena de leve
humor vir após uma cena em que se discute um assunto sério; ou uma agitação
no bar ser seguida de uma cena tranqüila em um parque equilibram a encenação.
A Antítese pode ocorrer em uma cena, mas é mais comum que seja empregada no
equilíbrio de cena contra cena.
Clímax. O clímax existe
quanto a ação vai em crescente complicação, a cada ato, convergindo para um
impasse cuja solução não é conhecida dos personagens e nem a platéia pode
prever qual será. O clímax depende de certa corrida dos personagens para seus
objetivos. Será difícil entender como clímax uma convergência muito lenta de
acontecimentos. Os personagens precisam estar ansiosos por alcançar seus
propósitos e agirem rápido nesse sentido, para que surja um verdadeiro
impasse pressionando por uma solução urgente. Os dramaturgos normalmente
colocam o clímax no segundo ato ato, conforme o Ternário acima referido
(Protasis, Epitasis e Castrophe). Porém, se houver quatro, começam a
exploração do tema suavemente, no primeiro ato, fazem crescer a trama no
segundo, e o enredo torna-se progressivamente mais complexo e insolúvel até a
solução vislumbrada ao cair do pano do terceiro ato. As explicações acontecem
no quarto ato, no qual é mostrado o destino de cada personagem,
vitoriosos ou derrotados, e paira no ar uma conclusão de natureza moral
da qual os espectadores guardarão memória.
Suspense. O suspense, como
o clímax, existe quanto a ação vai, a cada ato, convergindo mais e mais
para um final. No suspense, o espectador pode suspeitar o que está prestes a
acontecer, mas os personagens envolvidos não percebem o que lhes está
reservado. O caráter de cada personagem precisa ser logo conhecido pela
platéia, assim como suas intenções; um reconhecido ser um velhaco na sua
primeira entrada. Os outros personagens estão no papel de inocentes,
descuidados, ingênuos, que desconhecem o que o velhaco lhes prepara, mas a
platéia já sabe o que ele é e o que ele pretende, e pode suspeitar qual será
o desfecho. O fato de a platéia ter esse conhecimento tem um efeito
paradoxal, que é tornar mais interessante o suspense.
Incorre em erro – que
com certeza comprometerá o sucesso de sua peça –, o dramaturgo que cria
em sua assistência a expectativa de uma cena extraordinária, exigida pela sua
condução prévia da trama, e essa cena não se realiza como esperado,
frustrando assim o suspense criado no espectador.
Recursos a evitar. Fazer
um número grande de cenas curtas, fazer a história saltar vários anos para
frente, ou fazer uso do recurso de flash back, isto cria confusão e
irritação nos espectadores. Outros recursos que se deve evitar são: criar
personagens invisíveis, que são descritos em minúcias mas que nunca aparecem
no palco. Também prejudica o interesse da Platéia aquelas cenas em que um
personagem deixa o palco e volta trazendo algum recado ou conta uma novidade.
Outros ainda são os apartes e os solilóquios.
O aparte consiste em o ator
falar uma frase audível para a assistência mas que se supõe não seria ouvida
por um outro personagem no palco, ou por todos os demais. O ator dá um passo
fora da moldura do palco para falar confidencialmente com a platéia. O aparte
contraria a regra de que o ator deve manter-se aparentemente alheio à sua
audiência.
O solilóquio é chamado construtivo quando
serve para explicar o progresso de uma trama de modo a deixar a história mais
clara para o espectador, ou para encurtar o drama. É chamado reflexivo quando
é empregado apenas para revelar à platéia certa seqüência de pensamentos de
um personagem, sem que por meio dele o dramaturgo faça qualquer referência
utilitária à estrutura da trama. Um bom ator pode fazer um solilóquio
reflexivo sem perder a naturalidade. Embora o solilóquio reflexivo possa ser
útil e mesmo belo, o solilóquio construtivo é tão indesejável como o aparte,
porque força o ator para fora do contexto do mesmo modo.
Final Feliz. Conceber um
final para uma história pode ser a parte mais difícil do trabalho criativo.
Um final precisa corresponder ao fechamento lógico do drama desenvolvido nas
cenas antecedentes. Não pode ser a solução de conflitos colocados apenas nas
últimas cenas, nem a solução para os conflitos colocados no início,
deixando-se de lado as complicações que se seguiram. O final feliz precisa
ser crível, aceitável para os espectadores como a melhor opção, ou como
desfecho claro e compreensível que satisfaz de modo inteligente ao suspense,
traz o alívio que dissipa as tensões do clímax, e espalha um sentimento de
compensação plena na platéia.
Rubem Queiroz Cobra
Lançada em 06-09-2006
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