NOÇÕES DE TEORIA DO TEATRO
Esta página, e também as outras páginas desta
série, contêm algumas noções de Teoria do Teatro para uma visão geral do
trabalho de planejamento de uma peça teatral. Acredito que essas noções poderão
ser razoavelmente informativas para o leitor em geral, e úteis ao Orientador
Educacional que deseja tomar o teatro por instrumento pedagógico, enquanto não
encontrarem um bom livro ou um Site na Internet com informações mais completas
sobre o assunto.
O Teatro.
Existe grande polêmica sobre a definição de Teatro.
Porém, uma página sobre Teoria do Teatro deve começar – me parece –, pela
definição do que o Teatro é. Então, se partimos do fato irrecusável de que há
uma história, escrita ou memorizada, que dá origem ao drama a ser representado,
então o drama está subordinado a uma peça literária, por mais simples e rústica
que esta seja. A Arte Dramática, ou Arte do Teatro – que envolve a
arte de bem representar, a arte da iluminação, a arte da montagem do cenário,
etc. –, é uma forma de manifestação artística a serviço da Literatura, assim
como também a própria Arte do Livro – que envolve a arte da
ilustração, a arte da impressão, a arte da encadernação, etc.
No Teatro, uma história e seu contexto se fazem
reais e verídicos pela montagem de um cenário e a representação de atores
em um palco, para um público de espectadores. Por exemplo: um indivíduo pode
não acreditar na existência do fantasma em uma história que lê em um livro, mas
terá a sensação de realidade desse fantasma se ele o vê no palco, e se o
personagem lhe parecer autêntico, por agir do modo como, na sua concepção, um
fantasma haveria de agir..
Pode ser dito, então, que o teatro é uma
forma de manifestação artística em que uma história e seu contexto se fazem
reais e verídicos pela montagem de um cenário e a representação de atores
em um palco, para um público de espectadores.
A representação teatral será o resultado
do trabalho de muitos profissionais: do dramaturgo, dos atores maiores e
menores, do diretor de palco, do pintor do cenário, do maestro da orquestra, e
de outros de cujo talento e competência a arte da dramaturgia depende para
atingir seu objetivo. E como este é o de levar uma mensagem em um trabalho
artístico unificado, para que seja de fato Teatro necessita da presença e do
interesse dos espectadores. No grande Teatro, uma performance de sucesso é a
que consegue a harmonia perfeita entre todos esses elementos.
O drama. A "peça de teatro", ou drama,
em conseqüência do acima dito, é o projeto escrito com a finalidade de dar à
peça literária – poderá ser uma pequena história pensada já para ser
levada ao teatro, ou uma fábula, ou um romance –, a sua expressão teatral.
O Dramaturgo, através de um roteiro escrito ou script, rege as funções das artes unidas
para a representação, assim como um maestro rege os instrumentistas da sua
orquestra para uma execução. No palco, os personagens vão “viver” a história,
vestidos de acordo com a narrativa, em um cenário – parte concreto, parte
imaginário, sugerido por meio de paineis e objetos, e de sons especiais e
música – representativo do ambiente em que a história acontece, com uma
iluminação disposta para obter efeitos complementares importantes de luz e sombra.
O dramaturgo, portanto, precisa não apenas de competência literária para
redigir sua peça, mas também conhecimento e sensibilidade sobre todos os outros
elementos estéticos envolvidos na arte de representar.
O dramaturgo muitas vezes deixa a estruturação dos
diálogos para o final, depois de selecionar os atores e trabalhar o cenário em
detalhes. Começa por dividir a história em atos e somente depois de toda a peça
estar planejada ele volta ao início para escrever os diálogos. Deste modo, ao
escrever o roteiro, o dramaturgo já tem em mente os atores escolhidos, a
categoria ou qualidade do teatro ou sala, se será um palco ou simples estrado,
os recursos de iluminação, e o público ao qual a representação se destina.
Etapas da dramaturgia. Clayton Hamilton (The Theory of the Theatre and Other
Principles of Dramatic Criticism. Henry Holt and Company, New York City, 1910 – Proj.
Gutenberg), considerando o progressivo desenvolvimento dos palcos, fala de três
etapas na evolução do teatro. A primeira e longa etapa, – que ele
chama Dramaturgia da Retórica – , vem da antiguidade
até ao Renascimento, do período grego até à época de Shakespeare ao tempo
de Isabel I. Nessa fase a expressão teatral
recorria ao poder da Retórica e da Poesia. À segunda Etapa, bem mais curta, ele
chama Dramaturgia da Conversação, pois o dramaturgo apelava para o
brilho e inteligência dos diálogos, através dos quais ele também sugeria o
cenário para a Plateia. E à terceira etapa chama Dramaturgia da
Ilusão de Realidade, que se inicia no século XIX, quando o desenvolvimento
da encenação – marcada pela introdução da luz elétrica – leva a compor no palco
o cenário da história com toda a ilusão de realidade feita possível pela tecnologia.
A Dramaturgia da Retórica apresentava-se sobre
plataformas a céu aberto, lidava com discursos e palavras impressionantes; os
atores vestiam roupas suntuosas, e desfilavam em procissão através do palco. O
Drama da Retórica era conseqüência das condições físicas do palco elisabetano.
Não havia cenários pintados ou montados, e o contexto em que a história
acontecia era sugerido no drama por meio de monólogos, passagens poéticas,
descrevendo a luz do luar, ou a floresta, o mar, as montanhas, conforme necessário
para ambientar a história. Duas velas e a imagem de um santo sobre uma mesa era
bastante para representar um templo. A magnificência, mais que propriedade da
indumentária, era buscada pelo ator de plataforma na Dramaturgia da Retórica..
A Dramaturgia de Conversação predominou durante o século
XVIII. Ela surgiu quando a idéia de construir cenários foi posta em prática por
William Davenant (1606-1668), gerente do teatro do Duque de York. A partir de
1660 ele passou a representar o ambiente de suas comédias e tragédias usando
cenários montados no palco, o que exigiu que as casas de espetáculo fossem
fechadas e cobertas, e o palco iluminado por candelabros e lustres centrais.
Como a mudança do cenário, entre um ato e outro, precisava ser oculta, passou a
ser usada uma cortina, inexistente nos palcos da era anterior. Todas essas
melhorias tornaram possível uma aproximação maior ao realismo da representação
nunca feita antes. Palácios ou campos floridos, jardins, o interior de salas e
mesmo ruas e calçadas podiam agora ser sugeridas por um cenário construído, em
lugar de sê-lo por passagens descritivas em diálogos e monólogos. Os costumes
tornaram-se apropriados, e os objetos eram mais cuidadosamente escolhidos para
dar ainda maior sabor de realidade à cena. Porém, a iluminação precária
obrigava os atores a representar junto às lanternas na beira do palco. A
oratória gradualmente desapareceu e os discursos foram abolidos, e as linhas
poéticas deram lugar a diálogos rápidos e inteligentes. A Dramaturgia de Conversação,
portanto, era apresentada com mais naturalidade e fidelidade ao real que a
Dramaturgia da Retórica que a precedeu.
A Dramaturgia da Ilusão de Realidade ou Dramaturgia do Realismo foi o
resultado do avanço da tecnologia em todos os setores, inclusive na
dramaturgia. Seu início tem por referência a descoberta do uso da eletricidade
tanto em iluminação como em mecanismos os mais variados. O palco tornou-se
essencialmente pictórico, e começou a ser usado para representar fielmente os
fatos reais da vida. Descobriu-se o valor de pontuação do "baixar as
cortinas", que antes eram usadas meramente para ocultar tarefas de
preparação do palco. O expediente passou a ser usado ao final do ato, e os
atores não mais tinham que debandar do palco ou se reunir em semicírculo para
se curvar para a platéia na última cena. Em lugar da mobília formal do período
anterior, foram introduzidos móveis que eram cuidadosamente desenhados para
servir as condições reais do compartimento a ser representado. A partir de
então os cenários avançaram rapidamente para um sempre maior grau de realidade.
Porém o realismo tende à banalidade. A maior parte
dos dramaturgos é de realistas, e ao criar suas situações eles buscam ser
estritamente fieis e exatos em sua representação do real. O resultado é que as
circunstancias de suas peças tem uma aparência ordinária que as fazem parecer
simples transcrições da vida diária em lugar de estudos sob condições especiais
e peculiares da vida.
Tragédia. O drama da tragédia apresenta o espetáculo de
um ser humano se esfacelando contra obstáculos insuperáveis. A Tragédia é um
confronto necessariamente destinado à derrota do herói, porque a vontade
individual humana é lançada contra forças opostas maiores que ela. Portanto, a
tragédia desperta compaixão, porque o herói não pode vencer – e
terror, porque as forças mobilizadas contra ele não podem perder. Mas, por
outro lado, é evidente que a tragédia é em si um tipo mais elevado de arte. Na
tragédia grega clássica, o indivíduo luta contra o Destino, uma força
imponderável que domina igualmente as ações dos homens e dos deuses.
Porém, a partir do século XVII – nas
tragédias representadas pela grande dramaturgia Elisabetana –, o indivíduo
está predestinado ao desastre não mais devido à força do destino, mas por causa
de certos defeitos inerentes à própria natureza humana; os personagens
mergulham para a destruição por causa deles mesmos; os elementos do seu caráter
tornam inevitável um determinado fim . O herói trágico se vê enredado no
emaranhado que a fatalidade arma para os incautos. A morte do alpinista
congelado pelas neves eternas, seria trágica. Sua ambição de proeminência como
um esportista radical traz cada vez mais nela própria a possibilidade latente
de seu fracasso em um extremo de estupendo esforço. Mostra a ruína de uma
natureza heróica devida a uma ambição insaciável de superação, condenada por
sua própria vastidão a derrotar a si mesma. Do autor da tragédia se exige, por
esse motivo, que apresente uma inevitabilidade inquestionável –
nada pode acontecer em sua peça que não seja um resultado lógico da natureza de
seus personagens.
O Drama Social. O conflito inerente ao
drama, a disputa que permite ao espectador tomar partido e se interessar pela
representação no palco, encontrou um tema novo no século XIX: o poder
econômico, rico e opressor, contra o qual o indivíduo pobre luta em vão, sem
oportunidades, explorado pela classe economicamente dominadora, e que está
condenado eternamente à sua miséria. Hamilton, acima citado, explica que o Drama
Social surgiu como uma nova linha da tragédia em que as forças do destino se
materializavam como forças das convenções sociais sobre a pessoa. O herói grego
luta com o sobre-humano, o herói do drama elisabetano luta contra si mesmo, e o
herói do Drama Social luta contra o mundo. Neste tipo de tragédia, o indivíduo
é mostrado em conflito com o seu ambiente, e o drama trata da poderosa guerra
entre o personagem e as condições sociais. Assim, enquanto os gregos
religiosamente atribuíam a fonte de todo destino inevitável a uma
predeterminação divina, e o teatro elisabetano a atribuía às franquezas de que
a alma humana é herdeira, o dramaturgo moderno prefere atribuí-la
cientificamente à dissensão entre o individuo e seu meio social.
Mas, o sucesso que teria esse tema já anteriormente
muito explorado, não seria devido apenas à simpatia e piedade das platéias para
com os desvalidos, mas porque havia uma solução para o conflito que envolvia
uma outra disputa, ainda mais séria e profunda, e assim fazia o drama duplamente
apelativo e interessante para a platéia. É que, desde o final da Revolução
Francesa (o período do Terror), se firmara uma corrente de pensamento adepta
de Rousseau, segundo a qual somente uma
pequena minoria de luminares e de hábeis e inteligentes políticos poderia por
fim à injustiça social, e que esse fim era o desejo de todos como uma “vontade
geral” dos homens. Essa “vontade geral” encarnada nessa minoria, era mais
importante que a “vontade da maioria” democrática. Em oposição a essa corrente,
os constitucionalistas acreditavam na democracia e no mercado livre,
valorizando a consciência do indivíduo como capaz de fazer voluntariamente sua
parte pelo bem social. A primeira considerava a sociedade suprema, e o
individuo subserviente; cada homem era suposto existir em benefício do
mecanismo social do qual ele era uma peça. A segunda considerava o indivíduo
como capaz de construir uma sociedade justa e democrática a partir do esforço
pessoal de todos. O Drama social está baseado simultaneamente no conflito entre
o indivíduo e a sociedade, e esta dividida na luta entre aquelas duas correntes
de pensamento.
Esse novo filão temático garantiu o êxito não
apenas na dramaturgia. Serviu também com imenso sucesso ao cinema, à literatura
popular, ao discurso político, e inclusive a novas correntes religiosas, num
tal paroxismo de fé que dos filmes, dos livros e da dramaturgia saltou para as
paradas, passeatas, revoluções e praticamente toda forma de agitação do início
do século XIX até o seu ocaso, no fim do século XX. Com a progressiva
diminuição do interesse pelo Drama da injustiça social colocado nessas bases, a
literatura e a dramaturgia buscaram o enfoque de outras formas de opressão
social igualmente poderosas e trágicas, como o racismo, o preconceito contra
minorias, o tabu do sexo, a hipocrisia social, e outros..
Melodrama. Diferentemente da Tragédia, o Melodrama expõe
apenas o que pode acontecer, não o inevitável (O trágico expõe aquilo que está
fadado a acontecer). Um homem perder a direção do carro em um dia de chuva e
sofrer um acidente seria melodramático, porque poderia ser evitado . Tudo o que
nós pedimos ao autor do melodrama é uma plausibilidade momentânea.
Providenciado que sua trama não é impossível, não são impostos limites em sua
invenção de um mero incidente.
Comédia. Uma comédia é uma peça humorística na qual os
atores dominam a ação. A comédia pura é o mais raro de todos os tipos de drama.
Na comédia a ação precisa não somente ser possível e plausível, mas precisa ser
um resultado necessário da natureza ingênua do personagem.
Farsa. A farsa é um tipo de drama escrito com o
propósito de provocar riso. É estética e literariamente inferior à comédia; é
uma peça humorística na qual os personagens são rudes ou exageradamente fracos,
covardes e impotentes; as situações são de exagero, improváveis, tendo por
cenário consultórios de dentista, consultórios médicos, o quarto de dormir, a
recepção de hotéis, etc. É comum a associação dos dois tipos, farsa e
comédia, em uma única peça humorística, com o uso da comédia para a trama maior
e da farsa para os seus incidentes subsidiários. A farsa é decididamente o mais
irresponsável de todos os tipos de drama. A trama existe por sua própria conta,
e o dramaturgo precisa preencher somente duas exigências ao criá-la: primeiro,
ela precisa ser engraçada , e segundo, ele precisa persuadir sua audiência a
aceitar suas situações pelo menos no momento enquanto elas estão sendo
encenadas.
Pantomima. Peça de teatro ou drama em que a história é
contada por meio de ação e expressão corporal, sem uso de palavras.
A moralidade. Na dramaturgia, como nas outras formas de
arte, o aspecto moral diz respeito à interpretação e por isto há que separar
aquilo que pode ser relativo, daquilo que for racionalmente condenável,
tolerável ou louvável. É relativo o que é condenável apenas em relação aos
hábitos de um grupo. Quanto ao julgamento racional, não pode haver algo que,
por si, seja um assunto imoral para uma peça teatral. O que pode ser julgado,
desfavorável ou favoravelmente, é o tratamento do assunto pelo dramaturgo. A
questão, por exemplo, não é se prostitutas merecem aprovação ou não, mas se uma
certa mulher dessa classe, colocada em uma situação particular, não seria
merecedora de simpatia. Seria desonesto o dramaturgo apresentar sua versão dos
fatos como única verdade, quando o assunto é de valor relativo, e seria também
desonesto retratar em detalhes uma realidade que é racionalmente imoral, como a
violência sem motivo, o sexo sem amor, o roubo sem uma grave justificativa,
etc. É condenável a peça que estimula os maus instintos do ser humano e
louvável a que faz o contrário: desperta no espectador noções de valor e emoção
de esperança. Porém seria desonesto negar o desespero, a infidelidade, o crime,
e apresentar ao público a imagem de um mundo sem essas mazelas que precisam ser
vencidas.
A história educativa. O grande Teatro tem seus temas
polarizados em aspectos particulares da natureza humana e no que aflige ou
alegra os homens em geral. Não aborda temas que são momentâneos, não discute
problemas sociais. Dessa sorte, a época e o lugar em que se desenvolve a trama
são acidentais, porque o que se buscará mostrar serão aquelas maldades ou
bondades do homem, que lhe são próprias em qualquer época. Porém não é assim
com o Teatro Pedagógico. A este cabe muito bem a
discussão de problemas sociais contemporâneos, para os quais, encontrada a
solução, aquela peça pedagógica a eles referente perderá o sentido.
Embora no Teatro Pedagógico o Diretor de Teatro
trabalhe com um objetivo educacional, esse propósito deve ficar em um aparente
segundo plano, para que o interesse pela representação teatral, em suas
múltiplas facetas, possa captar o interesse dos alunos e mantê-los
entusiasmados com o projeto. Isto porque os jovens, e mesmo as crianças, não
serão muito diferentes dos adultos nesse particular. O espectador comum não vai
ao teatro para ser doutrinado. Regimes autoritários e antidemocráticos já
utilizaram o teatro para esse fim, com as pessoas coagidas a comparecerem aos
espetáculos. O que cada indivíduo na platéia espera é que haja algum
divertimento.
Script. O roteiro, texto da peça ou script, contem a fala dos atores e
as indicações quanto à expressão dos sentimentos e atitudes de cada personagem,
e ao cenário. É desenvolvido em torno da idéia central ou tema, e da história a
ser representada, que veicula essa idéia e seus desdobramentos. A divulgação
impressa do script, é uma obra literária. Uma peça que é intrigante, que de
algum modo desafia o espectador a cogitar de algum significado que não estaria
alcançando, leva-o a indagar o que o dramaturgo estaria tentando passar. Isto é
praticamente impossível saber, por vários motivos. Primeiro, o significado que
o espectador vê no que é representado é função de uma construção pessoal, e vai
diferir daquele sentido, que é também pessoal, que o próprio autor em
qualquer obra de Arte, no caso o dramaturgo,
pretende que a sua obra tenha. Segundo, a interpretação feita pelo ator
influirá na percepção de cada um na platéia: também o ator dará à sua
represetação um acento pessoal, que poderá não transmitir com fidelidade a
idéia pretendida pelo dramaturgo. O título de uma peça atrai o expectador
justamente quando mexe com sua imaginação, parecendo-lhe que está no rumo de
suas idéias e emoções.
A platéia. Em tese, a reação da platéia será a soma das
reações individuais dos espectadores. Mas existem certos comportamentos que são
estimulados nas pessoas quando elas fazem parte de uma multidão. Pessoas
refinadas que estão isoladas em meio a indivíduos mais simples e despreocupados
podem perder consciência de sua posição social e qualidades intelectuais e
assumirem o mesmo comportamento primitivo do grupo. O contrário infelizmente não
acontece, ou seja, aqueles menos educados
inseridos em um grupo de pessoas bem educadas e comedidas não se deixam
intimidar, e primam por incomodar com comentários jocosos, gargalhadas
exageradas, etc. Uma platéia de jovens pode mostrar esse mesmo fenômeno e
acontecer que alguns precisem ser advertidos ou retirados da platéia por uma
autoridade. Um tema controverso, uma história mal representada, atores
que não convencem em seus papeis, podem levar a platéia à agitação e desordem,
o que será uma surpresa, quando se espera que a boa intenção do autor seja
recompensada com a aprovação e o respeito da assistência. Mas um acompanhamento
simultâneo de música, meio escutada, meio imaginada, que conduz ao humor da
peça, agora crescendo para um climax, agora suavizando para a quietude, pode
fazer muito para manter a audiência sintonizada com o significado emocional da
ação.
Dispersão de foco. No grande Teatro, o
Dramaturgo tem o cuidado de não inserir na peça nada que desvie a representação
da lógica da narrativa e da suave sucessão dos quadros. O Diretor de cena
estará atento a qualquer deslize da equipe que possa chamar a atenção dos
espectadores, desviando-a da representação em curso. Novidades técnicas que
sejam demasiadamente complexas, na movimentação do palco, na iluminação,
no cenário, desviam o foco da atenção da
platéia, suscita comentários cochichados e – além da admiração do
espectador que deveria ser inteiramente para o valor do drama ser colocada na
maravilha tecnológica –, também suscitam comentários e murmúrios que perturbam
a atenção de todos. Porém, ao contrário, uma outra forma de possível dispersão
de foco é um cenário muito pobre ou mesmo a falta de um
cenário.
Um animalzinho que apareça de repente e perambule
pelo palco irá provocar distração e risos na platéia. Se no papel de um ator
está previsto um tiro de revolver, os espectadores devem estar conscientes de
que ele porta uma arma através de menção no diálogo, ou porque tenha estado
visível em alguma cena anterior. O caráter forte ou ante-ético de um
personagem, não pode ser revelado de súbito, em cenas finais. É preciso que a
platéia perceba desde sua primeira fala que determinada personagem é, por
exemplo, capaz de trair. Um erro de entonação de um ator, um engasgo, um tombo
no palco, tudo isto, em grau maior ou menor, prejudica o espetáculo.
Um cenário excessivamente rico,
excessivamente detalhado, ou que tenha mistura de estilo e cores que não
combinam, levam o espectador a analisar e comentar as discrepâncias, e prestar
menos atenção ao drama. No grande Teatro, um diretor de cena que vai usar algo
de novo e ousado, abre a cortina em a presença dos atores e faz que esses
entrem e iniciem a representação apenas depois de certo tempo dado aos
espectadores para absorver a novidade.
Guardadas as proporções, essas preocupações valem
também para o Diretor de Teatro na Escola. Porém, a simplicidade do cenário
esperada no teatro pedagógico coloca entre os principais cuidados serem tomados
aqueles necessários para evitar imprevistos.
A ênfase no drama. A força de uma narrativa
dramática está na sonoridade do texto expressa nas falas, nos diálogos, na
locução, etc. É necessário aplicar o princípio positivo da ênfase de modo a
forçar a platéia a focar sua atenção naquele certo detalhe mais importante da
matéria em questão.
A ênfase por repetição pertence ao diálogo e pode
ser com habilidade introduzida no script. Porém há também momentos
que emprestam ênfase natural à representação e que o dramaturgo deve
aproveitar, como os últimos momentos em qualquer ato (que são os mais propícios
a criar o suspense), ou o início de uma ação nos primeiros momentos em um ato.
Porém os primeiros momentos do primeiro ato perdem essa faculdade devido à
falta de concentração dos espectadores que acabam de tomar seus lugares, ou são
perturbados por retardatários que passam pela frente das pessoas já
sentadas (Veja, por favor, em Como escrever uma peça).
Cenário, iluminação e música. Em seu conjunto a
construção do cenário, compreendendo tanto os painéis desenhados onde figuram
janelas, quadros pendurados na parede, etc., quanto os móveis e outros objetos
componentes do ambiente da cena, precisam obedecer normas estéticas que
conduzam a uma visão harmoniosa, descansada e ao mesmo tempo crível para o
espectador.
A iluminação é um recurso polivalente para o
cenógrafo. Pode dar ênfase a certos aspectos do cenário, pode estabelecer
relações entre o ator e os objetos, pode enfatizar as expressões do ator, pode
limitar a um círculo de luz o espaço da representação, além de muitos outros
efeitos sutis.
A música tem função semelhante: enfatiza cenas,
empresta-lhes maior ou menor conteúdo dramático, sublinha os sentimentos
expressos pelos atores.
Os atores. A representação está,
fundamentalmente, na voz e nos gestos dos atores. Cada personagem deve falar
com voz distinta e clara, e suas vozes não podem ser confundidas na
representação: o espectador deve distinguir inclusive pela voz cada personagem.
As mínimas ações e expressões dos atores podem transmitir ao espectador
significados muito intensos, desde aqueles que ele perceberá com clareza até
outros que se poderá dizer que são subliminares, porque o espectador não
poderia dizer ao certo o que está afetando seus sentimentos (Veja, por favor,
em Uma teoria da Arte).
A razão principal porque o maneirismo no caminhar,
ou nos gestos, ou na entonação vocal são reprováveis em um ator é que eles
distraem a atenção da platéia, desviando-a do que ele está representando, e
atraindo-a para o seu método de representar – de um efeito que é buscado para o
modo como busca criar esse efeito. Um ator sem maneirismos é capaz de produzir
um convencimento mais imediato.
As vestes são importante complemento representativo
do personagem. Elas estarão desenhadas, obviamente, de acordo com a descrição
que a história a ser dramatizada faz dos personagens. Estarão em harmonia com o
sexo, a idade, a classe social, a profissão do personagem representado, e
refletirão ainda outras particularidades como seu nível social, país e época
histórica em que vive, clima regional e, se requerido pelo drama, também sua
religião, profissão, etc.
Um ator que está acostumado ao centro do palco
muitas vezes encontra dificuldade para manter-se ao fundo nos momentos em que a
cena deveria ser dominada por outros, que algumas vezes podem ser atores
menores.
Rubem Queiroz Cobra
Lançada em 04-09-2006